A origem do sonho
Ser freelancer foi, desde o fim da minha licenciatura em Educação e Comunicação Multimédia, um daqueles sonhos que eu guardava com entusiasmo... mas também com receio. Sabia que queria criar algo meu, viver do meu trabalho criativo, construir um caminho fora do tradicional. Mas faltava coragem, e talvez maturidade também.
Durante anos fui fazendo alguns trabalhos aqui e ali. “Freelas” para amigos, conhecidos, pequenos negócios da zona. Coisas simples, que surgiam naturalmente. Mas nunca levei isso muito a sério. Era algo que fazia no tempo livre, quando havia espaço. Um plano B. Um complemento. Nunca foi o centro da minha vida profissional.
Até que, há uns anos, comecei a mergulhar em podcasts sobre empreendedorismo criativo. Podcasts americanos, cheios de energia, ideias, liberdade. Onde se falava de construir um negócio em torno do que tu sabes fazer melhor. De viver do teu talento. De trabalhar de onde quiseres, com quem quiseres, ao teu ritmo. E aquilo mexeu comigo. Sentia-me em casa nessas conversas. Como se estivesse a ouvir aquilo que sempre quis dizer, mas ainda não sabia como.
Passei a devorar tudo: vídeos no YouTube, cursos online, entrevistas com freelancers, designers, criativos, fundadores de estúdios. Queria aprender tudo. Branding, Webflow, processos, precificação, marketing. Quanto mais aprendia, mais vontade tinha de dar o salto.
Foi aí que decidi: quero mesmo viver disto. Criar o meu próprio emprego. O meu próprio espaço no mundo do design e criatividade.
A realidade fora do plano
Tinha alguma noção das dificuldades de ser trabalhador independente. Já sabia que havia impostos para pagar, contribuições para fazer, meses incertos. Achava até que estava minimamente preparado. Mas a verdade é que... ninguém te prepara realmente para tudo o que vem com esta decisão.
Uma das maiores lições que aprendi, e talvez uma das mais duras, foi perceber a importância da comunicação. Pensava que bastava fazer bom trabalho e pronto. Mas não. É preciso saber apresentar o trabalho. Saber explicar o valor daquilo que fazes. Saber vender ideias. E fazê-lo de forma clara, confiante e humana, tanto em português como, idealmente, em inglês.
Sempre fui introvertido. Muito tímido mesmo. Ao ponto de suar só com a ideia de estar numa chamada com um cliente. Gravar um vídeo ou aparecer numa reunião por vídeo era impensável. Sentia-me completamente fora da minha zona de conforto. Mas isso foi mudando. Com o tempo, com prática, com pequenos desafios diários. Hoje, já consigo estar numa reunião, defender uma proposta, apresentar um conceito com segurança. E digo-te com toda a honestidade: se eu consegui, qualquer pessoa consegue. Só é preciso começar devagar e não desistir à primeira.
Olhando para trás, vejo claramente que se tivesse investido mais cedo na forma como comunico, não só o que faço, mas o porquê, os bastidores, o processo… Possivelmente teria conquistado mais e melhores oportunidades. A comunicação, no freelancing, é meio caminho andado.
Dinheiro, modelos e decisões difíceis
E depois há as finanças. Esse eterno desafio. Esse desconforto que nos acompanha mesmo quando achamos que já dominamos tudo.
Podes estudar, ver vídeos, consultar especialistas... mas nada te prepara para aquele momento em que vês um pagamento entrar e tens de começar logo a dividir mentalmente: uma parte vai para o IVA, outra para a Segurança Social, outra para guardar para o mês seguinte. Não há salário fixo. Não há previsibilidade. Há contas, planeamento e gestão constante. Cada orçamento que envio é um verdadeiro exercício de tentar adivinhar o futuro. Tento sempre pensar a 3 meses de distância, pelo menos. Estabilidade, neste contexto, é algo que se constrói com esforço e muita organização.
Uma das melhores decisões que tomei cedo foi criar modelos para tudo: orçamentos, contratos, propostas. Mesmo assim, aprendi que cada cliente é diferente. Que os modelos são só o ponto de partida. Cada proposta precisa de ser adaptada. E o equilíbrio entre poupar tempo e não cair no copy/paste sem alma é uma arte que ainda estou a afinar.
Quando percebi que o plano não era suficiente
Já levo um ano como freelancer a tempo inteiro. Já tive meses bons, daqueles que me fazem pensar "isto está mesmo a correr bem". E já tive meses em branco, em que o silêncio é pesado e a ansiedade bate à porta com força. Esta montanha-russa emocional é talvez das coisas mais difíceis de gerir.
Vejo muita gente a partilhar planos infalíveis para atrair clientes através das redes sociais, com estratégias altamente estruturadas, funis de venda, conteúdo otimizado, automações. Tudo isso é útil, sem dúvida. Mas, na prática, o que me atrasou mais foi ficar demasiado tempo preso ao planeamento. Ver vídeos, aprender, consumir, pensar, preparar… e nunca executar. Estive nessa fase durante demasiado tempo.
Até que percebi que o melhor plano é começar. Mesmo que não esteja perfeito. Mesmo que não tenhas ainda todas as respostas. Porque só ao fazer é que começas a perceber o que funciona, o que não funciona, o que precisas de melhorar.
Por isso, se estás a pensar lançar-te como freelancer, seja em design, desenvolvimento, ilustração, fotografia… o melhor conselho que te posso dar é este: pensa, planeia o mínimo necessário… e depois age. Faz. Começa pequeno, começa com o que tens, mas começa. Porque esperar pelo momento ideal é o maior autoengano deste mundo.
Nada disto é fácil. Mas posso garantir-te uma coisa: vale a pena.